AS ESCOLAS SECRETAS DA CABALA
Olá pessoal! Nesse post vou falar sobre como os cabalistas judeus guardaram com tanta restrição certas técnicas e conhecimentos que muitas escolas ou grupos de cabalistas nem chegaram a ter conhecimento umas das outras.
Hoje em dia muitos conceitos relacionados à cabala são identificados até mesmo pelo grande público que é leigo, embora não se possa dizer que absolutamente tudo a respeito desse corpo de conhecimentos já tenha sido exposto, ao contrário, o principal permanece ainda preservado em grupos muito restritos. A cabala é um amplo acervo de conhecimentos e tem bases sólidas, o que é facilmente encontrado são referências a uma ou outra interpretação, elementos separados, não o todo. Cabala não se trata de "receita de bolo" que possa ser ensinada em uma semana, nem um grimório com técnicas estilo "faça você mesmo" nem tão pouco pode se encontrar tudo a respeito em um único livro, trata-se de interpretações baseadas em conceitos sólidos, mas, que também permitem certa margem de adaptação pelo adepto, uma certa "flexibilização" mas que não se afasta muito dos conceitos originais. Apesar de vários elementos terem se tornados públicos, se dependesse dos rabinos que guardam, absolutamente nada disso viria a público. Na Renascença alguns elementos da cabala vieram à público e foram incorporados pelos ocultistas e literatos cristãos da época, até mesmo em algumas pinturas de Michelangelo e Leonardo Da Vinci há elementos, e Cornélio Agrippa cita alguns conceitos em sua obra "Três Livros de Filosofia Oculta" mas não significa que eles eram cabalistas praticantes ou que tivessem estudado a fundo todo o sistema, apenas pegaram alguns elementos.
Para se ter uma ideia do modo restrito como certas técnicas e textos da cabala foram guardados, Aryeh Kaplan em sua versão comentada do Sêfer Ietsiráh menciona que alguns sábios judeus dos primeiros séculos da era Cristã eram proficientes em técnicas práticas do Sêfer Ietsiráh, mas que desconheciam completamente técnicas relacionadas à merkabah (falei resumidamente sobre merkabah no meu canal no Youtube CANAL OCCULT POP link à direita no blog) pois foram mantidas por outra escola esotérica, veja o trecho:
"O Talmud relata que Rabi Iossef conhecia os mistérios da Mercabá, enquanto os 'Anciões de Pumpedita' eram versados nos mistérios da Criação. Rabi Iossef conseguiu que os anciões lhe ensinassem os mistérios da Criação mas não lhes confiou os mistérios da Mercabá.
Isso indica que os mistérios da Mercabá e do Sêfer Ietsirá eram ensinados por escolas diferentes, e que membros de uma escola não conheciam os ensinamentos da outra. As duas envolviam-se em diferentes disciplinas e tinha-se o cuidado de mantê-las separadas."
Assim sendo, percebe-se que os grupos cabalistas não divulgam completamente suas técnicas, mesmo para outros grupos cabalistas. De fato, houve um período na história em que o conhecimento cabalístico ficou de posse de um pequeniníssimo grupo, e, os demais grupos judeus sequer tinham ideia dos conceitos a respeito.
Quando importantes textos de conteúdo cabalísticos são publicados isso acontece porque os grupos cabalistas que preservaram esses textos e possíveis usos práticos deles decidiram que aquele era o momento certo, ou porque estava para ser feita uma importante revelação ou para acelerar a "vinda do Messias" (de acordo com a concepção judaica a vinda do Messias que não foi Jesus seria acelerada com a divulgação de certos ensinamentos esotéricos, a divulgação seria necessária para sua vinda). Um exemplo é a publicação do Bahir o Livro da Iluminação atribuído a Nehunia ben Hakanah sábio e líder de uma escola esotérica do primeiro século da era Cristã. Veja o comentário de Arieh Kaplan no prefácio de sua versão da obra:
"Com o encerramento do período talmúdico, o círculo de cabalistas diminuiu e, em certas épocas, pode não ter ultrapassado uma parca dúzia de indivíduos.(...)
Por isso não surpreende que eméritos eruditos, como Saadia Gaon (882-942) e Maimônides (1135-1204), nunca tivessem visto o Bahir, ou que o Rabino Yehudá ben Barzilai de Barcelona (1035-1105) não fizesse qualquer menção a ele em seu extenso comentário sobre o Sêfer Ietsirá. O texto era de domínio privado e restrito a uma pequena sociedade secreta, onde pessoas estranhas ao círculo não deviam sequer saber de sua existência. (...)
Diz a tradição que o Bahir foi preservado por uma pequena escola de cabalistas na Terra Santa (Jerusalém).(...)
Logo depois, a principal escola cabalística mudou-se para a França-principalmente para Provença. Essa região tornou-se um importante centro de Cabala e lá foi tomada a decisão de publicar o Bahir."
Portanto, não é de se estranhar que um texto de conteúdo cabalístico tão importante tenha se mantido desconhecido por séculos mesmo para importantes cabalistas. O mesmo em relação ao Zohar. Eu não vou entrar em debates e minúcias a respeito de quem seria seu verdadeiro autor, mas, esse Zohar só veio à publico porque a escola esotérica que detinha esses conhecimentos decidiu que era a hora certa de publicar manuscritos dele. O cabalista espanhol Moshe de Leon foi o escolhido para tornar público esse texto. Veja o comentário de Arieh Kaplan a respeito disso em "Meditação e Cabalá":
"O próprio Zôhar provê uma pista, declarando que deveria ser revelado em preparação para a rendenção final, mil e duzentos anos depois da destruição do segundo Templo. Como o Templo foi destruído no ano 69, isto significaria que o Zôhar seria revelado em 1269. A sociedade secreta que foi guardiã destes mistérios confiou esta tarefa ao Rabino Moshe de León, que possivelmente foi membro desse grupo."
Outro exemplo de como técnicas são mantidas ocultas com tremenda restrição pelos cabalistas é relacionado a técnicas meditativas muito avançadas, técnicas capazes de fazer com que o praticante entre em estado mental semelhante aos dos profetas do Antigo Testamento. Realmente os profetas do Antigo Testamento eram pessoas especiais escolhidas para a missão de transmitir a mensagem divina, mas, também haviam técnicas e escolas que preservavam essas técnicas. Quando o grande cabalista Abraham Abuláfia começou a ensinar seu sistema que também envolvia estados meditativos avançados ele afirmou que não o inventou por conta própria, mas, que usou elementos de avançadas técnicas meditativas que já existiam mas que eram mantidas em segredo e nunca antes tinham sido divulgadas, veja esse trecho de Meditação e Cabalá:
"O próprio Abuláfia escreveu que 'nehum outro cabalista antes de mim escreveu livros explícitos sobre esse assunto.'"
Em muitas referências na tradição cabalística se fala sobre o poder de "nomes divinos" ou "nomes de Deus" e que Moisés teria usado alguns desses nomes para realizar seus grandes milagres. Não se trata de "nomes de Deus" propriamente, mas, sim palavras que encerram funções, conceitos e energias. A pronúncia correta e feita com a entoação e energia correta dessas palavras desencadeariam feitos que seriam considerados absurdos. O conhecimentos de alguns desses nomes e como usá-los permaneceu de posse de um restrito grupo de cabalistas através dos tempos. Veja o que Arieh Kaplan diz a respeito:
"Até mesmo a existência desta sociedade era totalmente desconhecida para os de fora, até que ela finalmente apareceu sob a liderança do Baal Shem Tov.
De acordo com esta tradição, a Sociedade dos Nistarim (escondidos) foi fundada em 1621 ou 1623, logo após a morte do Rabino Chayim Vital. Seu fundador foi o Rabino Eliyáhu de Chelm (1537-1653), conhecido como Eluyáhu Baal Shem. (...)
O título Baal Shem significa literalmente 'Mestre do Nome' e, em geral, parece ter sido agraciado àqueles que souberam fazer uso dos Nomes Divinos na Cabalá Prática."
Resumindo, embora pareça através da popularização dessa "cabala pública" que tudo já foi exposto, na verdade uma parte apenas foi exposta (muitas vezes mal interpretada por leigos) e as mais extraordinárias técnicas e textos da cabala prática ainda permanecem guardadas por restritos grupos e possivelmente nunca virão a público estando restrita aos grupos que os preservam.